A tendência política da Câmara Municipal de Rio Preto no período da pós-redemocratização — entre 1945 e 1964 — foi acentuadamente conservadora. Os discursos de vereadores como Benedito Rodrigues Lisboa e José Maria Rollemberg Sampaio (este por curto período em 1949, quando pela primeira vez se falou em reforma agrária numa sessão da Câmara) eram duramente combatidos pelos principais vereadores do decênio. Alberto Andaló, por exemplo, combateu, em 1949, o discurso de Rollemberg Sampaio sobre a Reforma Agrária e, Raul Francisco Tauyr, principal representante do Integralismo na Câmara, combatia com veemência as ideias de Rodrigues Lisboa, um político de tendências socialistas.
Um exemplo clássico foi a rejeição, em 16 de fevereiro de 1956, do requerimento de congratulações com João Goulart por ter sido eleito vice-presidente da República. O requerimento era de Benedito Lisboa e o vereador Fábio Marcondes Homem de Mello liderou a votação contra Goulart. Quando Jânio Quadros renunciou à Presidência da República, a Câmara reagiu contra a posse de Goulart. A maioria esmagadora dos vereadores foi contra a posse, exigindo uma solução não democrática para o impasse nacional. Rodrigues Lisboa apresentou, em 29 de agosto de 1962, o requerimento 426 protestando contra “qualquer solução extralegal que impeça a posse do Sr. João Goulart”. A sessão, que sempre teve transmissão ao vivo, neste dia foi realizada sem a presença da rádio. A Rádio PRB 8 não compareceu para a transmissão dos trabalhos dos vereadores. Lisboa estranhou o fato e fez registrar em ata que “a ausência da PRB 8 na sessão faz parecer, em virtude da censura, que a democracia corre sério risco de sobrevivência no Brasil”, fazendo uma negra previsão: “esta talvez seja a última sessão da Câmara”. O vereador Alberto Targas Filho pintou o quadro político daqueles dias ao afirmar que “os fatos políticos que hoje se desenvolvem, no cenário nacional, são uma página negra, vergonhosa, como herança que deixará para seus filhos essa republiqueta chamada Brasil’.
No dia 5 de setembro de 1961, Benedito Lisboa, que era presidente municipal do PTB, apresentou requerimento de congratulações com o governador Leonel Brizola e com o general José Lopes Machado, comandante do III Exército, pela ação à favor da legalidade e pela Constituição. O vereador Washington Simardi apresentou requerimento propondo um voto de louvor ao Congresso Nacional pela instituição do Parlamentarismo. Já o vereador Gumercindo Sanches Filho, também de tendência socialista, apresentou moção contra “a violação das franquias democráticas e dos direitos constitucionais”.
No dia 31 de março de 1964, horas antes da deposição de João Goulart, a Câmara Municipal realizou sua sessão noturna normalmente. O país estava em crise, notícias sobre a possibilidade de uma revolta militar circulavam cada vez mais fortes, mas o golpe de estado só aconteceu na madrugada, ao alvorecer do dia 1º de abril. Ainda nessa sessão, antes do golpe, o vereador José Eduardo do Espírito Santo, do PTB, propôs em plenário que a Câmara Municipal realizasse uma “sessão permanente em face da crise político-militar que eclodiu no dia de hoje e se avoluma, ameaçando as instituições democráticas e para exame e debate da momentosa situação”. O vereador Armando Casseb declara-se à favor da sessão permanente, dizendo que “o PTB lutará com todas as suas forças para que o presidente da República [João Goulart] supere a crise que ameaça a estabilidade da Pátria”. O vereador José Barbar Cury reconheceu que “a situação é realmente grave” mas ponderou que a Câmara deveria “aguardar melhores esclarecimentos”. O vereador José Jorge Júnior, em nome do PSP, disse que era contra a sessão permanente. O requerimento da sessão permanente foi rejeitado por 11 votos a sete. Votaram a favor da vigília os vereadores Adail Vettorazzo, Armando Casseb, Benedito Rodrigues Lisboa, Fuade Elias, João Concenza, João Mangini e Lisbino Pinto da Costa. Votaram contra: Alberto Olivieri, Alberto Targas Filho, Antônio Marques dos Santos, Arthur Nonato, José Barbar Cury, José Chalella, José Jorge Júnior, Nelson Barbosa, Nivaldo Carrazone, Norberto Buzzini e Raul Francisco Tauyr.
No dia 4 de abril de 1964, o quarto dia após o golpe militar, a Câmara Municipal reuniu-se em sessão extraordinária, às 17h15, com 18 dos 21 vereadores, para votar a cassação dos colegas Armando Casseb, Benedito Rodrigues Lisboa e José Eduardo do Espírito Santo. A sessão durou exatamente 20 minutos (das 17h15 às 17h35). Os vereadores tiveram seus mandatos cassados, segundo a ata da reunião, por causa da “sua atuação na vida política deste Município em que se revelaram abertamente adeptos das doutrinas comunistas e membros ocultos do PCB”. A votação foi unânime pela cassação. No plenário, os líderes rio-pretenses do movimento militar acompanhavam a votação, prontos para mandar cassar e até prender quem votasse à favor dos três colegas denunciados. Apenas o vereador Alberto Targas Filho fez rápido uso da palavra, para lamentar que “investido da função de vereador, eu tivesse que votar favoravelmente à cassação de mandato para salvar a democracia”.
Os vereadores cassados recorreram à Justiça e ganharam o direito de voltar à Câmara, mas jamais puderam concretizar o direito adquirido porque os vereadores da época recorreram às últimas instâncias da Justiça para ganhar tempo e impedir a reintegração dos cassados às suas cadeiras de vereador. No lugar deles, assumiram os suplentes Arlindo Massi, Saturnino Garcia Peres Filho e Walter Dias. Dois dias depois a cassação, em 6 de abril, requerimento do vereador José Barbar Cury, aprovado por unanimidade, transformou a sessão ordinária em sessão cívica “para exaltação dos fatos e pessoas que deram origem ao grande movimento democrático e restauração do regime de liberdade, de garantia das famílias e das instituições”. Na mesma sessão, foi aprovado requerimento do vereador Adail Vettorazzo “hipotecando inteira solidariedade à indicação do general Castelo Branco à Presidência da República”. Nessa votação, Alberto Targas Filho declarou, revelando o receio que tomava conta da maioria dos políticos naqueles dias que “seria preferível perder a vida do que perder a liberdade; que se faça o expurgo do comunismo ateu, mas é preciso cuidado para que o país não se incline ao extremado capitalismo de direita, espoliador”.
Os três vereadores cassados obtiveram na Justiça, ainda em junho de 1964, mandado de segurança contra a cassação. A Justiça apontou existência da irregularidade na cassação. Imediatamente, no dia 11 de junho, o vereador Raul Tauyr propôs uma nova sessão para confirmar a cassação e sanar qualquer irregularidade. A Câmara preferiu empurrar o caso na Justiça. Em dezembro de 1965, o Tribunal de Justiça mandou reintegrar os três vereadores no mandato, mas novamente a Câmara recorreu, apostando no fim do mandato. Sem clima para continuar exercendo sua profissão de jornalista em Rio Preto, José Eduardo do Espírito Santo mudou-se para Cuiabá, onde refez a vida profissional, chegando a atuar na assessoria de imprensa dos governos estaduais, tornando-se, mais tarde, membro da Academia Mato-grossense de Letras. Armando Casseb e Benedito Rodrigues Lisboa não conseguiram recuperar o mandato cassado, porém conquistaram o direito de continuar cidadãos de pleno direito. Na eleição seguinte, em 1967, os dois foram eleitos e reconduzidos à Câmara Municipal, numa prova cabal de que foram vítimas da intolerância política de um grupo circunscrito de cidadãos. A cidade lhes devolveu o mandato. Casseb se reelegeu pela Arena, ao lado daqueles que haviam cassado seu mandato em 1964; Benedito Rodrigues Lisboa elegeu-se pelo antigo MDB, que iniciava seus primeiros passos na oposição ao regime militar.
A intolerância campeou solta nos primeiros meses da ditadura militar. Mais de 300 pessoas foram detidas e muitas fugiram da cidade para escapar da sanha dos partidários do militarismo. O delegado Tácito Pinheiro Machado comandou pessoalmente, ao lado do juiz de Direito, José de Castro Duarte, a repressão em São José do Rio Preto. E muitas pessoas foram acusadas injustamente. O engraxate negro, Aristides dos Santos, foi o primeiro a ser preso em Rio Preto, às 7h30, do dia 1 de abril de 1964, denunciado como comunista foi preso pelo delegado Pinheiro Machado. Ficou dez dias detido e trinta dias em prisão domiciliar. O médico Ivan Rollemberg também foi detido pela Polícia no dia 1 de abril de 1964, sob acusação de ser comunista. O médico Gumercindo Sanches Filho, vereador da Legislatura anterior (1960/63), perdeu seu emprego na Prefeitura e só foi reconduzido ao cargo e indenizado pelo Município nos anos de 1980, no primeiro mandato do prefeito Manoel Antunes.
A instituição mais duramente atingida pelo movimento militar de 1964 foi a FAFI (atual Ibilce/UNESP). Um grupo de delatores e apoiadores do regime militar fez com que um grupo de professores fosse banido da FAFI e da cidade; alguns foram banidos do país. Na lista dos banidos estavam Arruda Penteado, Casemiro dos Reis Filho, Estêvão Nador, Flávio Di Giorgi, Jamil Almansur Haddad, João Jorge Cunha, José Aloísio dos Reis Andrade, Maurício Maurice Tratberg, Orestes Nigro, Rodolfo Azzi, Sarah Rottembergue e Wilson Cantoni.


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